Termelétrica usa gás metano de aterro sanitário na geração de energia suficiente para abastecer uma cidade de 400 mil habitantes e fatura quase R$ 30 milhões com venda de créditos de carbono
Por Carlos Carvalho
A extração de 20 mil Nm³ por hora de metano, no aterro Sítio São João, permite a geração de 200 mil MWh de energia |
Transformar em energia o gás metano extraído da decomposição de resíduos sólidos. Essa é a missão da usina termoelétrica Biogás, em operação no perímetro do aterro sanitário Sítio São João, localizado na zona Leste da cidade de São Paulo e sob a administração da concessionária Ecourbis Ambiental. A usina é a maior planta de geração de energia do Brasil e tem capacidade de extração de metano de 20 mil Nm³ por hora.
Em funcionamento desde 2007, hoje ela já utiliza todo o gás metano extraído do aterro, desativado em 2009, para a geração de 200 mil MWh de energia, que é vendida para a Eletropaulo, empresa estatal de distribuição de energia elétrica. A energia limpa produzida é suficiente para abastecer uma cidade de até 400 mil habitantes.
Antes da instalação da termelétrica, a maior parte do metano produzido na decomposição do lixo era emanada diretamente para a atmosfera. "Antigamente, ocorria a queima passiva do gás, mas isso mitigava apenas 20% do metano. Os outros 80% iam diretamente para a atmosfera. Hoje, toda essa queima é controlada e utilizamos praticamente 100% do gás", explica o engenheiro Anderson Alves, da Biogás São João Energia Ambiental, empresa responsável pela administração da usina.
Uma pequena parte do metano extraído do aterro acaba se perdendo durante o processo, como explica o coordenador de operação e manutenção da usina, William Silveira. "Tudo o que entra em um equipamento mecânico acaba sofrendo uma perda. Neste caso, durante o percurso que o gás percorre do aterro até ser transformado em energia na usina, ele sofre uma perda de 3%, que é considerada praticamente insignificativa", afirma Silveira.
Infraestrutura da usina envolve trocadores de calor, coletores, queimadores (flares), chiller e motogeradores, entre outros equipamentos |
O processo
A usina termelétrica do aterro São João tem 40 km de tubulação, distribuída em uma área de 80 hectares, que possui 170 poços para a extração do gás. O processo de conversão do metano em energia ocorre por meio de um processo relativamente simples: o gás passa de energia térmica para mecânica e depois é convertido em energia elétrica, que é colocada então na rede de distribuição gerenciada pela Eletropaulo.
A usina termelétrica do aterro São João tem 40 km de tubulação, distribuída em uma área de 80 hectares, que possui 170 poços para a extração do gás. O processo de conversão do metano em energia ocorre por meio de um processo relativamente simples: o gás passa de energia térmica para mecânica e depois é convertido em energia elétrica, que é colocada então na rede de distribuição gerenciada pela Eletropaulo.
Em geral, o metano pode começar a ser extraído a partir de aproximadamente seis meses após os resíduos sólidos terem sido aterrados. Essa fase é conhecida como metanogênese, em que o gás começa a ser produzido por meio da decomposição anaeróbia (sem oxigênio) dos resíduos depositados no aterro sanitário. Durante todo esse processo, há o escoamento do líquido percolado, também conhecido como chorume, gerado a partir da decomposição dos resíduos orgânicos.
"O sistema de captação e distribuição tem drenos verticais, horizontais e transversais. Os verticais servem para drenar o chorume, que é mais denso e escoa por gravidade. O gás é menos denso, então é capturado pelos drenos e levado até a usina para a geração de energia elétrica", diz Alves.
No aterro São João são retirados, em média, 9 l de chorume por segundo, que são escoados por gravidade através dos drenos até a parte mais baixa do aterro, onde dois grandes reservatórios armazenam o líquido, que posteriormente é enviado em caminhões pipa a uma unidade de tratamento da Sabesp. O tipo de resíduo depositado no aterro, o percentual de matéria orgânica, o clima, a pressão atmosférica e uma série de outras variáveis podem interferir na quantidade de chorume e na produção do gás metano.
Cerca de 40 km de tubulação e 170 poços espalhados pelo aterro fazem a extração do metano |
A usina do Aterro São João possui três queimadores chamados flares, que têm, cada um, a capacidade de queimar 5 mil Nm³/h de metano a uma temperatura de 1.050ºC, como explica o engenheiro coordenador do projeto. "Todo o gás que é extraído do aterro precisa ser queimado controladamente, injetando o combustível no motogerador ou queimando nos flares, onde se tem a destruição do metano perto de 100%", diz Alves.
EQUIPAMENTOS DA USINA |
■ Quatro sopradores com capacidade de sucção de 6 mil Nm3/h e pressão de operação entre 140-170 mbar; ■ Três debitómetros com capacidade de 25 mil Nm3/h; ■ Resfriador com capacidade de 230 TR; ■ Três flares de alta eficiência com 5 mil Nm3/h de capacidade (-1.050°C); ■ Painel de controle com sistema de supervisão e controle automático e interface de operação à distância. Recolhe dados a cada minuto; ■ 16 geradores a motor de 1,54 MW cada; ■ Planta de motores. |
O metano extraído do aterro através dos drenos é levado até a usina, onde passa por um resfriador que retira toda a umidade do metano e parte das toxinas que poderiam prejudicar a geração de energia e causar uma perda na quantidade de gás, que tem que estar com um percentual de 45% para se tornar viável para produção de energia.
O metano é transportado por 16 motogeradores, cada um com capacidade para gerar 1,54 MW e fazer girar uma turbina que alimenta uma subestação responsável por transmitir a energia elétrica para a concessionária.
Créditos de carbono
A produção de energia limpa na usina termelétrica do aterro Sítio São João viabiliza a geração e comercialização de créditos de carbono. Os certificados permitem que cada tonelada de CO2 não emitida ou retirada da atmosfera por um país em desenvolvimento - no caso, o Brasil - possa ser negociada com empresas ou governos de países desenvolvidos que precisam alcançar metas ambientais.
A produção de energia limpa na usina termelétrica do aterro Sítio São João viabiliza a geração e comercialização de créditos de carbono. Os certificados permitem que cada tonelada de CO2 não emitida ou retirada da atmosfera por um país em desenvolvimento - no caso, o Brasil - possa ser negociada com empresas ou governos de países desenvolvidos que precisam alcançar metas ambientais.
Na usina Biogás, o gás passa de energia térmica para mecânica e depois é convertido em energia elétrica, direcionada à rede de distribuição da Eletropaulo |
O regime de concessão que a Biogás tem para a exploração do gás de aterro é de 15 anos, e 50% dos créditos de carbono do aterro pertencem à Prefeitura de São Paulo, que os vende por meio de leilões da BM&FBovespa. A administração paunlista afirma utilizar o dinheiro arrecadado para a manutenção da área em torno do aterro. Os outros 50% são de propriedade da Ecourbis Ambiental.
CONVERSÃO DE RESÍDUOS EM GÁS |
A Prefeitura de São Paulo já realizou três leilões de créditos de carbono na Bolsa de Valores de São Paulo. No segundo deles, que aconteceu em setembro de 2008, o metano gerado a partir dos resíduos do aterro desativado do Sítio São João propiciou a arrecadação de R$ 13,4 milhões aos cofres públicos, referentes aos créditos de carbono do período de março de 2007 e março de 2008. O preço final da venda foi de 19,20 euros por título, que equivale a uma tonelada de crédito de carbono.
O que é quantificado como crédito de carbono não é todo o gás do aterro, mas o percentual de metano extraído.
A usina possui quatro sopradores que fazem a extração do gás e três medidores de vazão, que é onde se quantifica o volume de gás extraído do aterro. A medição é feita em Nm³/h para se padronizar a pressão da vazão. O gás é mantido a 25ºC para a realização dos cálculos de créditos de carbono e de quanto CO2 equivalente deixou de ser emanado para a atmosfera.
Para a venda dos créditos de carbono é necessário que o projeto seja registrado na Organização das Nações Unidas (ONU) como Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), explica o coordenador do projeto. "A companhia precisa contratar uma empresa de auditoria certificada pela ONU, que corrobora todo o processo e o submete à Organização para que eles liberem os créditos. Nesse projeto, levamos quatro meses para a realização dessa certificação", diz Alves.
Novo aterro
O aterro sanitário Sítio São João está desativado desde 2009, servindo, atualmente, apenas para a extração do gás e o escoamento do chorume. No entanto, a concessionária Ecourbis Ambiental, que administra o local, também gerencia um novo aterro na mesma área - chamado de Central de Tratamento de Resíduos Leste (CTL). Ele foi inaugurado em novembro de 2010 e recebe todos os resíduos sólidos da região Sudeste da capital paulista.
O aterro sanitário Sítio São João está desativado desde 2009, servindo, atualmente, apenas para a extração do gás e o escoamento do chorume. No entanto, a concessionária Ecourbis Ambiental, que administra o local, também gerencia um novo aterro na mesma área - chamado de Central de Tratamento de Resíduos Leste (CTL). Ele foi inaugurado em novembro de 2010 e recebe todos os resíduos sólidos da região Sudeste da capital paulista.
Segundo a assessoria de imprensa da concessionária, um projeto para uma nova usina termelétrica no local já está sendo estudado e, desta vez, também será administrada pela Ecourbis, em parceria com a Prefeitura de São Paulo, nos mesmos moldes da parceria com a Biogás.
Ainda não há previsão de quando a usina estará em pleno funcionamento, mas o aterro, que tem uma área total de 1.130.000 m² já começou a produzir o gás metano, mas em uma quantidade que ainda não é suficiente para a geração de energia elétrica. De acordo com a assessoria de imprensa da Ecourbis, ainda não se sabe qual a capacidade de geração de energia que a nova usina terá, pois depende das avaliações que a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) deve fazer no aterro antes da instalação da usina.
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